Com a mecanização quase total da lavoura de cana-de-açúcar no Estado de São Paulo, figura do cortador se torna cada vez mais rara.
Depois de três dias viajando de ônibus desde Timbiras, no leste do Maranhão, o trabalhador rural Adão Alves da Silva, de 23 anos, desembarcou em Guariba, interior de São Paulo, em maio do ano passado, para trabalhar no corte da cana-de-açúcar. Ele se transformou em personagem raro. Menos de 150 migrantes chegaram de outros Estados nos últimos 12 meses para se empregarem como cortadores de cana em canaviais da região. Há dez anos, vieram 9.600, segundo a Pastoral do Migrante da Igreja Católica.
A quase extinção dos cortadores – apelidados de boias-frias – em São Paulo tem relação direta com a proibição da queima da palha da cana-de-açúcar, processo que se iniciou, de forma gradual, em 2007, e termina este ano. Sem a queima, o corte manual da cana torna-se inviável, e é necessário o uso de máquinas. Pela legislação, apenas pequenas propriedades, com menos de 150 hectares, ou áreas com declives acentuados, onde as máquinas não têm acesso, terão permissão para continuar com o corte manual.
Desde a safra de 2006/07, houve queda de 91,5% na área de colheita com autorização para queima em São Paulo. O número de colheitadeiras aumentou de 750 naquela safra para 3.080 na safra 2016/17, além de 670 colhedoras terceirizadas pelas usinas. Na safra atual, o governo do Estado autorizou a queima de apenas 136,9 mil hectares – 2,5% da área total plantada com cana-de-açúcar –, o menor número da história. Rumo Guariba, que no passado ficou conhecida como a “capital dos cortadores de cana”, por fornecer força braçal às usinas da região de Ribeirão Preto, maior produtora de açúcar e álcool do País, sofre de forma aguda os efeitos dessa mudança. “Antes, com a falta de mão de obra na região, as usinas e plantadores iam buscar cortadores em outros Estados”, lembra o secretário municipal de Administração, Daniel Louzada. Mas, com a proibição gradativa da queima da cana, as colheitadeiras modernas, que fazem o trabalho de até 100 trabalhadores braçais, tomaram conta das plantações. “Só uma usina do município, a Bonfim, chegou a ter 7 mil cortadores. Hoje, é tudo colheita mecânica. Não há mais alojamentos e até as casas de colonos foram demolidas”.
O processo de migração se inverteu. “A grande força migratória que vinha para a safra e retornava para seus Estados não existe mais. Aqueles que se fixaram aqui e não mudaram de atividade, agora viajam para cortar cana em Goiás”. Diariamente, saem cerca de dez ônibus da cidade com ex-cortadores que agora trabalham na indústria, comércio e serviços de Araraquara e Ribeirão Preto.
A chegada da mecanização mudou o perfil dos canaviais e trouxe para a região de Guariba empregos novos e mais bem remunerados que o de cortador de cana, embora em número menor. Uma nova profissão é a de mecânico de colheitadeira, que José Noli, de 52 anos, abraçou. Antes, ele era mecânico de trator. “Estamos com cinco colhedoras nesta fazenda. Enquanto quatro trabalham, uma fica na manutenção preventiva”.
Uma máquina como a que ele atende colhe 300 toneladas por dia, trabalho equivalente ao de 80 homens: “Elas operam também a noite, o que o braçal não pode fazer”. Cada máquina precisa estar acompanhada de pelo menos quatro profissionais: um operador, um soldador e dois mecânicos. Os salários variam de R$ 2,5 mil a R$ 3,5 mil.
Por: José Maria Tomazela
Veja também:
Aumento do combustível deve prejudicar consumo de etanol
Retificou o motor? Saiba como fazê-lo durar mais
Colhedeira, colheitadeira ou colhedora?
Compartilhe esse post: